Esse final de semana fiz um grande passeio. Além de fazer o que mais gosto que é estar com minhas filhas, eu tive a oportunidade de assistir em Nova Friburgo, no Festival de Inverno que lá acontece todo ano, um grande espetáculo. Isso mesmo um grande espetáculo. Nem eu mesmo sabia que poderia ser, mas foi, e como foi. Luis Melodia se apresentou nesse primeiro sábado de agosto numa noite fria quase gelada e eu estava lá cercado de duas lindas garotas que se vestiram como princesas para a ocasião. Luiza e Rachel de longe pareciam ser as notas musicais mais altas daquela noite de encanto musical.
Eu bem que sempre fui fã do "Pérola Negra", já assisti alguns shows dele nesse 47 anos de estrada, mas... Enfim, minha atenção estava voltada mais para a companhia do que para qualquer outra coisa. O local até que era bonito, o SESC estava lotado, uma platéia elegante, muito educada, todos esperando o astro, que não demorou a entrar.
Bem, a entrada dele merece bem um novo parágrafo nesse relato. Concentrado Melodia chegou e logo notou-se que se sentiu um pouco desconfortável e até um pouco irritado. Pensei até que era alguma coisa com o som. É comum acontecer isso nesses eventos. Estava eu enganado, o motivo de sua pirraça era o banco que lhe deram para se acomodar em frente ao público, que o deixava com os pés pendurados a alguns centímetros do chão, e o encosto das costas que de tão minúsculo não acomodava nem seus pares de rins. Tinha razão a nossa estrela da noite, isso não se faz com uma estrela. Deram-lhe uma mala de couro do som pra sentar e ele ficou satisfeito, e como. Acho até que foi ai que o show começou.
O show era acústico. Era ele e seu parceiro ao violão, o qual não tive a oportunidade de guardar o nome, não por desinteresse, mas por distração, e posso dizer que estou arrependido, pois o cara, alias o Cara merece respeito. Todas aquelas músicas brilhantes que dele já conheço foram sucedendo-se numa escalada de puro prazer, como num ato sexual que a cada toque preliminar prepara o clímax ao final. E no caso dessa noite chegaria bem antes da metade do show. Alguma novidade diferente de qualquer show de cantor famoso que conhecemos? Nenhuma, se não fosse o talento, a garra, a vontade de tocar e de cantar que a dupla mostrou para uma platéia admirada, que a cada solo de corda e de voz retribuía eufórica. Tocaram como se corressem atrás de um prato de comida, não que eles estivessem precisando, mas era visível a vontade de dar espetáculo. Tocaram como alguns dos melhores craques do nosso futebol do passado, com amor a camisa. O solo foi um capítulo a parte. A vontade era tanta que quase não se podiam ver os dedos que percorriam as cordas, coitado da viola, pois foi muito bem tratada, mas como apanhou.. A voz soava alto que acredito não precisaria de microfone, pois a vontade de ser ouvido atravessa montanhas. E que voz limpa e ritmada. Tudo isso contribuiu para que cada música se tornasse um espetáculo memorável. Não poderia deixar de falar da coreografia de samba no pé que Melodia nos presenteou quase levitando e nos reportando para a passarela do sambista da escola de samba do morro do Estácio, para delírio geral da platéia.
Para terminar, o show acabou. Minhas filhas penduradas em meu pescoço perguntavam ao mesmo tempo qual era mesmo o nome dele. Ele saiu do palco e nos deixou de água na boca e quero mais, quero mais. Após alguns minutos de quero mais, ele finalmente reaparece e novamente nos surpreende. Para surpresa geral, se possível ainda fosse, o bis foi ainda melhor do que o show inteiro. Se valeu a pena? Muito mais do que eles puderam imaginar. Deram uma lição de profissionalismo.
Por isso, então, eu recomendo: Faça como nessa noite. Faça do seu ofício o melhor espetáculo do mundo. Não deixe o sucesso, o poder, o dinheiro, a preguiça, a soberba e sentimentos ruins tomarem conta de seu trabalho, pois não importa o que você faça para ganhar a vida, sempre tem alguém ou muitas pessoas que podem precisar ou se emocionar com o que você faz.
Ivany Coutinho Neto
RJ, 03/08/2008.
